segunda-feira, 19 de março de 2012

Pesquisas divulgadas nos EUA reacendem polêmica sobre malefícios dos refrigerantes


Além de substâncias que podem causar câncer, bebidas contêm alto teor de sódio, inimigo número um da pressão arterial e de outras doenças

Vanessa Jacinto - Estado de Minas
Publicação: 19/03/2012 08:00 Atualização: 19/03/2012 12:56
Eleito como o pior alimento por especialistas em nutrição, o refrigerante também está sendo colocado na berlinda por estudos científicos que associam o consumo do produto ao surgimento de doenças graves. O último deles, desenvolvido pelo Center for Science in the Public Interest (CSPI), uma organização norte-americana da área de nutrição e segurança alimentar, traz novas evidências de que os refrigerantes Coca-Cola, Coca-Cola Diet, Pepsi e Pepsi Diet podem provocar câncer, devido à presença da substância 4-MEI, um subproduto do chamado caramelo 4, que dá a pigmentação às bebidas.

A substância foi incluída em uma lista de agentes cancerígenos depois que pesquisa do Programa Nacional de Toxicologia dos Estados Unidos indicou a conexão entre o 4-MEI e o desenvolvimento de câncer em ratos. A constatação levou o estado da Califórnia a determinar a inclusão dessa informação nos rótulos dos refrigerantes, conforme explica José Luiz Guidine, do Laboratório de Metabolismo Energético e Composição Corporal da Universidade Federal de Viçosa (UFV).

Segundo ele, as empresas, obviamente, repudiaram totalmente as descobertas e não gostaram nada da nova regulamentação. A porta-voz da Coca-Cola, Diana Garza-Ciarlante disse que aceitaram reduzir a quantidade do corante na fabricação dos refrigerantes apenas para que os produtos não estejam sujeitos à exigência de um aviso que chamou de “sem fundamento científico”.

Classificados como bebida gaseificada não-alcoólica e não fermentada, os refrigerantes apresentam em sua composição água mineral misturada com açúcar ou edulcorante (os adoçantes das versões light, zero e diet), extratos ou aroma sintetizado de frutas ou outros vegetais, corantes e gás carbônico. “Trata-se de um produto que não tem valor nutricional algum e que, além disso, é rico em calorias e outros ingredientes que podem prejudicar a saúde de quem o consome regularmente”, afirma a bióloga Fernanda Ribeiro, técnica da Proteste, uma associação brasileira de defesa do consumidor.

Segundo ela, uma análise das marcas mais comercializadas no Brasil confirmou a presença de altos teores de açúcares, sódio e edulcorantes nas bebidas. “As quantidades são inadequadas principalmente para crianças. No quesito quantidade de sódio, por exemplo, a ingestão de dois copos já ultrapassa os índices diários recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS) do que podemos consumir”, afirma.

As consequências da ingestão do refrigerante no organismo variam de acordo com a genética, a predisposição, periodicidade e quantidade ingerida. No caso das versões convencionais, em que existe alto teor de açúcar em cada porção, uma das maiores preocupações tem a ver com o ganho de peso e, consequentemente, com o surgimento do diabetes tipo 2. Segundo pesquisa da Universidade de Harvard (EUA), publicada na revista científica Diabetes Care, pessoas que ingerem uma ou duas porções diárias de bebidas açucaradas (cerca de 340 gramas) têm 26% mais chances de desenvolver o diabetes do que aqueles que consumem essas bebidas em menor quantidade. A ingestão de duas porções diárias também foi associada a um risco 20% maior de desenvolvimento de síndrome metabólica (conjunto de fatores de risco para doenças cardíacas).
A grande quantidade de sódio presente nos refrigerantes, tanto nas versões convencionais quanto nas versões sem açúcar (light, diet e zero), promove a retenção hídrica e, a longo prazo, pode desencadear o desenvolvimento da hipertensão arterial. Outros malefícios do consumo em excesso deste mineral são dores de cabeça, distúrbios fisiológicos, delírio e parada respiratória.

Sem saciedade
Os especialistas observam, também, que o gás acrescentado aos refrigerantes produz certa distensão gástrica, tanto como efeito imediato quanto contínuo, no caso de consumo frequente das bebidas. A distensão provocada pode aumentar a ingestão de alimentos, a fim de se alcançar a sensação de saciedade.

Para Ann Kristine Jansen, professora do curso de nutrição da Universidade Federal de Minas Gerais, o grande perigo do consumo do refrigerante tem mesmo a ver com o ganho de peso e o consequente desenvolvimento de doenças associadas à obesidade. Ela explica que a ingestão de bebidas açucaradas não desencadeia no cérebro o mecanismo de saciedade. É como se o organismo não reconhecesse as calorias ingeridas permitindo que a pessoa, mesmo depois de tomar dois litros da bebida (quase mil calorias!), ainda consiga ingerir outros alimentos, minutos depois, como se não tivesse comido nada. “Se você faz uma refeição de 1 mil calorias, comendo arroz, feijão, carne e verduras, por exemplo, isso não ocorre. A mensagem de saciedade dura muito mais tempo.”

Mas este não é o único problema do refrigerante, na visão da especialista. Segundo ela, dados do IBGE indicam que o consumo de refrigerante está associado à ingestão de alimentos menos saudáveis, ricos em gordura, sódio e açúcar. Mesmo os de versão light, zero ou diet induzem ao consumo de opções mais calóricas e menos nutritivas. Normalmente, o refrigerante é a escolha para acompanhar a pizza, o salgado, o fast foode, a pipoca e a batata frita, entre outros. “Além de vir em porções cada vez maiores, que por si sós são um atentado ao equilíbrio do organismo, os refrigerantes são um marcador de hábitos alimentares ruins. A presença maciça dessa bebida precisa ser desestimulada, justamente para conter o avanço da obesidade que já assola o nosso país. Entre os adultos, 50% da população apresenta excesso de peso. Na infância, na faixa etária entre 5 e 9 anos, a incidência de obesidade já é de 33%.”

Estudo já indicava benzeno nas bebidas


A presença de substâncias cancerígenas nos refrigerantes sempre foram uma preocupação para entidades ligadas ao consumo e à segurança alimentar. No Brasil, estudo realizado em 2009 pela Proteste e constatou a presença de benzeno em várias marcas da bebida. Os casos mais preocupantes foram os da Sukita Zero, que tinha 20 microgramas por litro de bebida, e o da Fanta Light, com 7,5 microgramas. Em índices menores, os refrigerantes Dolly Guaraná, Dolly Guaraná Diet, Fanta Laranja, Sprite Zero e Sukita apresentaram a substância que, segundo estudos, também pode oferecer ao consumidor o risco de desenvolver câncer. Para a OMS, não há limite seguro para a ingestão de benzeno e, na dúvida sobre a possibilidade de o produto fazer ou não mal à saúde, o melhor é evitar o consumo, como recomenda a bióloga Fernanda Ribeiro, técnica da Proteste, que conduziu o estudo. Ela explica que o composto vem sendo relacionado especialmente a leucemias e, mais recentemente, ao surgimento do linfoma.

Assim como nos Estados Unidos, a pesquisa motivou reações das autoridades. Acordo entre os fabricantes e o Ministério Público Federal em Minas Gerais determinou que os refrigerantes cítricos de baixa caloria reduzam, no prazo de cinco anos, a quantidade de benzeno. O Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado com a Ambev, Coca-Cola e Schincariol prevê que a quantidade máxima deverá ficar em cinco microgramas por litro. O documento foi assinado em novembro. “Esta é uma vitória e garantia para a saúde da população brasileira. Só é uma pena ter que esperar um prazo de até cinco anos para a mudança”, diz Fernanda.

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