quarta-feira, 14 de março de 2012

Derrubada de vetos do prefeito por atacado cria novas proibições em BH


Vereadores de BH promovem derrubada por atacado: das 16 novas leis, muitas estão fadadas a jamais sair do papel
Paola Carvalho - Estado de Minas
Publicação: 14/03/2012 06:00 Atualização: 14/03/2012 07:01
Lei que proíbe radares em determinados locais está entre as aprovadas (Juarez Rodrigues/EM/D.A Press)
Lei que proíbe radares em determinados locais está entre as aprovadas
Não à venda do cigarro picado. Não aos profissionais de saúde com jalecos em restaurantes. Não à instalação de radares em subidas, nem perto de árvores. Muito menos próximo a curvas. A Câmara de Belo Horizonte promulga nesta semana 16 novas regras a serem cumpridas pelos cidadãos, todas fruto de projetos vetados pelo prefeito Marcio Lacerda (PSB) e cujos vetos foram rejeitados pelos parlamentares da capital na sexta-feira. Entre as propostas que se tornarão lei nos próximos dias, algumas são aprovadas por especialistas. Outras, consideradas desnecessárias. Algumas, simplesmente demagógicas. Muitas, ainda que feitas com boa intenção, estão condenadas a jamais sair do papel.

O Projeto de Lei 1551/2011, do Professor Elias Murad (PSDB), proíbe a venda de cigarros avulsos - também chamados "picados" - em bares, restaurantes, mercearias, padarias, tabacarias, bancas de revista, camelôs e em qualquer outro lugar onde é praxe a venda do produto. A razão de o Executivo vetar a proposta do Legislativo é o Decreto Federal 7.212, de 16 de junho de 2010, que já define que a comercialização do cigarro deve ser feita exclusivamente em "maços, carteiras ou em outro recipiente, que contenham 20 unidades".

Indiferente ao argumento, o vereador defende que a nova proibição é fundamental para proteger principalmente crianças e adolescentes que encontram facilidades para comprar cigarros nos estabelecimentos comerciais da capital. A presidente da Comissão de Controle do Tabagismo da Associação Médica de Minas Gerais (AMMG), Maria das Graças Rodrigues, concorda. "A iniciação ao fumo está ocorrendo aos 12 anos e, normalmente, a criança não compra um maço, mas sim um só, para experimentar. Qualquer discussão ou medida proibitiva a essa iniciação é positiva", opina. Quem descumprir a decisão poderá ser primeiramente advertido e depois ter o material apreendido e ser autuado com multa de um salário mínimo.

Em meio à derrubada por atacado dos vetos do prefeito, há outra regra que diz respeito à saúde do belo-horizontino. O Projeto de Lei 1708/11, de Maria Lúcia Scarpelli (PcdoB), proíbe o "uso de vestimenta de proteção individual da área da saúde por frequentadores de bares, restaurantes e similares". Trocando em miúdos, o dono de restaurante que permitir a entrada de profissionais com jaleco em seu estabelecimento poderá ser multado em R$ 1 mil, o dobro na reincidência. O prefeito vetou por já existir lei que proíbe o profissional de saúde de circular fora do trabalho com "equipamento de proteção individual", o que inclui o jaleco. "A intenção não é mobilizar os fiscais da Vigilância Sanitária nisso, mas sim chamar a sociedade a agir contra essa falta de bom senso dos médicos", disse a vereadora.

O infectologista Carlos Starling é feroz em sua crítica. "Os vereadores estão criando tumulto em cima do nada", afirma. Segundo ele, não há nenhum estudo científico provando que o jaleco carrega bactérias capazes de contaminar uma pessoa. "Deveriam se preocupar em fiscalizar se os restaurantes oferecem álcool gel aos clientes. O preocupante é a mão, não o jaleco. Isso sim, protegeria a saúde da população", explica.

Freio nos radares
Na onda das proibições, os 50 radares fixos e três móveis da BHTrans foram alvo de duas restrições. Uma, do mesmo Wagner Messias (DEM), proíbe a instalação de equipamentos nos 50 metros depois do início de curvas, nos 100 metros depois do início de subidas e nos 50 metros antes e depois de qualquer árvore. Segundo o parlamentar, presidente da Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário, o objetivo é frear a "indústria da multa".

Mas o advogado Carlos Cateb, um dos colaboradores na elaboração do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), lembra que a proposta bate de frente com a Resolução 396 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), publicada em dezembro, que acaba com a obrigatoriedade de indicação da localização exata dos radares. "A lei federal é superior à municipal", ressalta o especialista, sem esquecer de outro impedimento: o CTB define que é competência do Executivo a implantação, manutenção e operação do sistema de sinalização, dispositivos e equipamentos de controle viário. "Essas regras são inconstitucionais", afirma Cateb.

A mesma razão põe na berlinda outra proposta cujo veto foi derrubado pela Câmara. De autoria da vereadora
Neusinha Santos (PT), a proposição proíbe o uso dos radares do tipo pardal na cidade, exigindo que o controle de velocidade seja feito apenas por meio de lombadas eletrônicas, aparelhos que contam com dispositivo digital em que motoristas podem verificar a marcação da velocidade de cada veículo. "Os pardais têm caráter arrecadatório e não têm resolvido o problema das mortes no trânsito. Eles não promovem a educação, apenas multas", afirma Neusinha.

Mestre em transporte e trânsito, o engenheiro Paulo Rogério Monteiro critica as duas proposições: "É o mesmo que a Polícia Militar avisar onde tem blitz. O radar simplesmente fiscaliza o cumprimento de uma regulamentação que deve ser obedecida em qualquer ponto da via. Essas medidas favorecem os infratores. São atitudes extremamente demagógicas e populistas", afirma. A BHTrans não comentou as proposições.

Ponto crítico
A promulgação de projetos considerados inconstitucionais é útil?

 (Juarez Rodrigues/EM/D.A Press)
L éo Burguês, presidente da Câmara Municipal

SIM

Muitas vezes, a Câmara promulga uma lei para forçar a discussão, como foi o caso do uso do cinto de segurança e da municipalização do Anel Rodoviário. Temos o voto e a voz para fazer valer a vontade do cidadão de BH. Talvez não seja prioridade para uns, mas é de extrema importância para um número pequeno de pessoas, o que torna um tema não menos importante. Muitos criticam os nomes das ruas. Para quem não tem endereço e não pode ter comprovante de residência é grave. As leis serão promulgadas e a expectativa é de que sejam cumpridas. Caso alguém tenha entendimento contrário, cabe à Justiça dar a decisão final.


 (Juarez Rodrigues/EM/D.A Press)
Marco A. Rezende, procurador-geral do município

NÃO


Regra geral, os vetos ocorrem por inconstitucionalidade, quando uma lei municipal repete o que já trata lei federal, sem inovar, por exemplo. Depois de promulgada, a prefeitura pode entrar com ação de inconstitucionalidade. Mas não necessariamente recorremos a isso, pois muitas vezes a lei não tem aplicação possível, nem pega. É muito ruim termos leis inconstitucionais. Priorizamos, contudo, as que podem criar inconveniência para as pessoas. A Câmara está dentro de suas atribuições, cada um cumpre o seu papel. Mas há disposições que são competências municipais, como o trânsito, que é regulado pela BHTrans.

Nenhum comentário:

Postar um comentário